A morte do major Almeida Torres na fazenda do Paraíso em Leopoldina, e sua repercussão na viagem do Conde d´Eu a S. João Nepomuceno

CONTINUAÇÃO DE: A festiva recepção ao Conde d´Eu na fazenda da União em Guarani

(Texto de Luís Pontes, publicado no jornal Voz de São João em 10/12/2022 – reeditado)

Há pouco comentávamos, nesta coluna, sobre a chegada do príncipe francês Gastão de Orléans, o Conde d´Eu, à fazenda da União, em Guarani, de propriedade do coronel Antônio Dias Ladeira Sobrinho, num sábado, 30 de setembro de 1882. Foi quando também dissemos que lá o Conde d´Eu se encontrou com Pedro Betim Pais Leme, o engenheiro-chefe e um dos diretores e principais acionistas da Estrada de Ferro União Mineira (EFUM).

Estava então previsto que o Conde d´Eu demorar-se-ia uns dois ou três dias naquela fazenda, até partir com Pedro Betim em direção a São João Nepomuceno, percorrendo a cavalo toda a terceira seção da EFUM, entre estas duas cidades, que então se encontrava em fase adiantada de construção.

Após o baile oferecido por seu anfitrião Dias Ladeira na noite de sua chegada, o Conde d´Eu passou a manhã do dia seguinte, domingo, 1º de outubro, conhecendo as benfeitorias daquela fazenda, onde também almoçou. Contudo, logo após a refeição, recebeu um telegrama de sua esposa, a princesa Isabel, informando-lhe que o mordomo de ambos, o major Benedito de Almeida Torres, falecera na véspera, precisamente no dia da chegada de Gastão de Orléans à fazenda da União. E assim, a princesa Isabel instava seu marido a que regressasse imediatamente à Corte por esse motivo.

Acerca do major Almeida Torres, também já discorremos brevemente em escritos anteriores. Ele era filho de José Carlos Pereira de Almeida Torres, o 2º Visconde de Macaé, que fora um grande fazendeiro no Rio de Janeiro, desembargador, deputado geral, presidente (governador) das províncias do Rio Grande do Sul e de São Paulo, ministro da Justiça e senador do Império. Por sua vez, Benedito de Almeida Torres foi um companheiro de armas do Conde d´Eu. Nesse sentido, mais de uma década antes, acompanhara o príncipe na Guerra do Paraguai, onde com ele participou da célebre batalha de Campo Grande, retratada num famoso óleo do pintor Pedro Américo, onde tanto ele, Almeida Torres, quanto Gastão de Orléans, aparecem em grande destaque.

Também dissemos que o major Almeida Torres, como mordomo do Conde d´Eu, acompanhara este último em sua viagem a Minas Gerais, que se iniciara com a ida de trem de ambos a Leopoldina em 13 de setembro de 1882. E, pouco depois, naquela mesma cidade, eles se hospedariam na fazenda do Paraíso, então pertencente ao 1º Barão de Mesquita. Porém, naquela ocasião, o major Almeida Torres caiu gravemente enfermo, vítima de pneumonia. Teve então que ficar sob cuidados médicos na dita fazenda, enquanto o Conde d´Eu se viu forçado a continuar sua jornada pela Zona da Mata mineira sem a companhia do mordomo.

Entretanto, enquanto viajava, o Conde d´Eu, preocupado com seu amigo, deu ordens ao dr. Marinho, um médico da Corte do Rio de Janeiro, para que este se dirigisse à fazenda do Paraíso a fim de tratar do enfermo. E é também possível que, ao longo das semanas seguintes de sua viagem a Minas, Gastão de Orléans deve ter periodicamente recebido informações acerca do estado de saúde de Almeida Torres, que, a despeito de todos os cuidados médicos, continuava bastante preocupante.

Até que, na madrugada de sábado, 30 de setembro de 1882, precisamente no dia em que o Conde d´Eu, saído de Rio Pomba, chegava à fazenda da União, Almeida Torres expirava na fazenda do Paraíso. A notícia da morte do mordomo do Conde d´Eu deve ter logo chegado à Corte carioca, com a qual a cidade de Leopoldina tinha um contato fácil e direto, tanto pela via férrea quanto por linha telegráfica. Desse modo, a triste novidade chegou até a Princesa Isabel no Rio de Janeiro, e esta, por sua vez, enviou um telegrama ao seu marido, participando-lhe do acontecido. Embora não saibamos exatamente para onde se destinou o telegrama da princesa Isabel, acreditamos ser possível que ele tenha se dirigido à estação da EFUM em S. João Nepomuceno, que, naquela mesma ocasião, já dispunha tanto de ferrovia quanto de telégrafo, e que então a mensagem possivelmente seguiu a cavalo até a fazenda em Guarani onde o Conde d´Eu se encontrava.

Diante disso, Gastão de Orléans decide abreviar a duração da sua viagem, marcando logo o início de seu retorno para o Rio de Janeiro. Nesse sentido, segundo noticiou o Jornal do Comércio em 23/10/1882:

Depois de haver tomado as necessárias providências para sua viagem no dia seguinte, partiu Sua Alteza para esta povoação [de Guarani], a fim de ouvir missa e examinar a via férrea em construção e que já chega até aqui.”

Em Guarani, o Conde d´Eu ainda visitou algumas residências, além da igreja do Divino Espírito Santo, onde assistiu missa. Também esteve numa escola, que inspecionou, bem como viu as obras da ferrovia, ciceroneado por Pedro Betim, e também foi à fazenda do tenente-coronel Toledo, onde jantou. Até que: “À tarde chegou Sua Alteza [de volta] à fazenda do coronel Ladeira (…). Nessa noite, não houve divertimentos na fazenda por causa do pesar que dominava Sua Alteza, em consequência da fúnebre notícia recebida pela manhã. Sua Alteza se entreteve, pois, em conversações familiares com as diversas pessoas que o acercavam, e pouco depois do chá, que lhe foi servido às 8 horas [da noite], por ter de partir pela madrugada. Sua Alteza, visivelmente comovido, despediu-se da distinta família do coronel Ladeira e de todas as pessoas presentes, agradecendo a todos as vivas provas de verdadeiro afeto e subida consideração com que foi recebido, e recolheu-se depois aos seus aposentos. No dia seguinte, às 4 ½ da madrugada, depois de uma ligeira refeição e de haver novamente se despedido das pessoas que o acercavam e com muito afeto do cirurgião-mor Caetano Machado, seguiu Sua Alteza para S. João Nepomuceno, em companhia do Dr. Pedro Betim, sendo também acompanhado à grande distância da fazenda pelo incansável e dedicado coronel Ladeira, pelos srs. juiz municipal e Gomes Tolentino, pelo distinto comerciante Tomé Borges dos Reis e por outras pessoas gradas, que ainda se achavam na fazenda da União.”

E assim, finalmente, o Conde d´Eu partia para São João Nepomuceno na manhã daquela segunda-feira, 2 de outubro de 1882, muito embora sua agenda nesta cidade agora ficasse bastante abreviada, e ainda por cima cumprida sob o luto do amigo Almeida Torres, conforme se continuará a ver com mais detalhes na sequência desse texto.


Igreja matriz do Divino Espírito Santo de Guarani (MG) em 1913 (foto do livro “Município de Guarani: esboço histórico e cronológico” de Pedro de Abreu). Nela, o Conde d´Eu assistiu à missa de domingo, 1º de outubro de 1882, logo após ter sido informado, por um telegrama de sua esposa, a princesa Isabel, da morte de seu mordomo e companheiro de armas, o Major Benedito de Almeida Torres em Leopoldina.

CONTINUA EM: A visita-relâmpago do Conde d´Eu a S. João Nepomuceno, num clima mais ou menos parecido com perder a copa do mundo

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