A “rua do buraco”, ou do Comendador João Medina

CONTINUAÇÃO DE: O Comendador João José Medina, um grande fazendeiro, investidor e político são-joanense no Segundo Reinado

(Texto de Luís Pontes, publicado no jornal Voz de São João em 27/05/2023 – reeditado)

Estávamos comentando, nesta coluna, sobre João José Medina, que foi um notável político, fazendeiro e investidor na segunda metade do século 19, tendo sido também o maior acionista são-joanense da Estrada de Ferro União Mineira, cujos trilhos aqui se inauguraram em 24 de junho de 1880. E sua destacada participação no financiamento da ferrovia foi possivelmente o maior motivo pelo qual D. Pedro II o distinguiu (junto de alguns outros são-joanenses de destaque) com a comenda da imperial Ordem da Rosa, no grau de cavaleiro, em 15 de junho de 1881.

É possível que, principalmente por causa de sua atuação na vinda da estrada de ferro, João Medina também receberia o nome de uma rua que começava nas imediações da nossa estação ferroviária e estendia-se na direção leste, até chegar ao lado do morro onde muito mais tarde seria erguido o prédio que abrigaria a Escola Normal Dona Prudenciana, e também o Instituto Barroso, entre outros educandários de nossa cidade. Isso é o que nos informa o dr. José de Azevedo, em sua crônica “Rua Comendador João Medina”, que depois seria publicada como parte de seu livro póstumo “História de minha rua, e outras histórias”.

Segundo o dr. Azevedo, a lei que decidiu pela denominação dessa rua foi assinada em 1906, tendo sido uma proposta dos vereadores Vicente da Costa Oliveira, Sebastião de Souza Lima e Antônio da Fonseca Lobão. Mas, ainda acerca desse logradouro, há outros pontos muito curiosos mencionados por Azevedo, que, no início de sua crônica, diz o seguinte: “Pouco depois da metade do século passado [isto é, dos 1800], mais uma rua era aberta em nossa cidade. Terminava ela, porém, em frente a um grande morro, não dando saída para lado algum. Era o que se poderia chamar de um beco sem saída… Apelidou-a, por isso mesmo, o nosso povo com o nome de RUA DO BURACO. Julgava-a nossa gente como um verdadeiro buraco. Depois, para ali veio o Reverendíssimo Padre Francisco Rodrigues Condé, que, num trabalho inteligente, laborou no sentido de ligá-la à atual rua Capitão Ferreira Campos [a “rua do Descoberto”], desaparecendo, assim, a razão do apelido, mas na memória do povo ficou [desse jeito]. Em 1936, fez justiça ao Padre o poder público, denominando Travessa Padre Condé a via pública que ele ajudara [que] fosse aberta.”

Já um segundo ponto notável acerca dessa rua, também de acordo com José de Azevedo, é o fato de que ela era muito maior do que é atualmente. Segundo o que ele viu nos registros legais de nossa cidade, tal rua ia “da praça Augusto Glória [nas imediações da estação ferroviária, atual museu municipal], até a rua Domingos Henriques de Gusmão [da atual Câmara municipal são-joanense, que se estende até próximo à chamada “padaria do Popó”]. E, ainda conforme este autor: “Verifica-se, pela simples leitura do texto legal, que não corresponde mais hoje à realidade o trecho a ela atribuído. Seccionaram-na, amputaram-na, reduzindo-a a um terço do seu primitivo comprimento”.

Por outro lado, o texto de José de Azevedo não esclarece exatamente como isso aconteceu. Isto porque, quando se desce a atual rua do Buraco, percebe-se que ela, na verdade, não tem como se prolongar diretamente em direção ao prédio da estação ferroviária, já que seu traçado se confronta diretamente com um quarteirão. Talvez este último tenha sido erguido somente depois do surgimento da rua original. Ou então talvez essa “parte baixa” da antiga rua do Buraco seja o trecho hoje conhecido como a rua Governador Valadares. Só que se sabe também que esta última, na verdade, resultou de um desmembramento, em 1938, da rua Visconde do Rio Branco (a do morro do prédio da Escola Normal Dona Prudenciana), de modo que tal hipótese parece não ter procedência (além do fato de que a dita rua Governador Valadares não se encontra exatamente no prolongamento da rua do Buraco, de forma que, caso essa última hipótese tenha seja a verdadeira, então tal logradouro teria que fazer uma pequena curva, para continuar seu caminho da atual capela de Santo Antônio até a estação ferroviária.

De todo modo, e conforme também atesta José de Azevedo: “É sobremodo elogiável o gesto dos [supracitados] vereadores, que de seu nome [isto é, de João Medina] se lembraram para patrono de uma de nossas ruas, porque, assim, evitou-se fosse ele muito mais cedo relegado ao esquecimento”. E Azevedo então terminou sua crônica como sempre o fazia, escrevendo: “Há na força do passado a alegria e o consolo das ressurreições”.


A rua Comendador João Medina, ou “do Buraco”, com a capela de Santo Antônio ao fundo e sua típica escadaria em ziguezague (foto de Serjão Missiaggia).

CONTINUA EM: A “igualdade entre os diferentes” na política são-joanense do Segundo Reinado

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